O aviso prévio na rescisão por mútuo acordo após a reforma trabalhista

A reforma trabalhista (Lei 13.467/17) acrescentou à CLT uma nova modalidade de rescisão contratual: a rescisão por mútuo acordo entre empregado e empregador.

reforma trabalhista (Lei 13.467/17) acrescentou à CLTuma nova modalidade de rescisão contratual: a rescisão por mútuo acordo entre empregado e empregador.

Nos termos do artigo 484-A, na hipótese de rescisão por mútuo acordo, o empregado tem direito às seguintes verbas trabalhistas: (i) metade do aviso prévio, se indenizado; (ii) metade da multa rescisória sobre o saldo do FGTS prevista no parágrafo 1º do artigo 18 da Lei 8.036/1990 (20%, portanto); (iii) todas as demais verbas trabalhistas (saldo de salários, férias vencidas e proporcionais indenizadas, 13º salário etc.) na integralidade; (iv) saque de 80% do saldo do FGTS.

Vale destacar que essa modalidade de extinção do contrato não autoriza a habilitação do empregado no seguro-desemprego.

Apesar de elencar as verbas devidas e em qual proporção, o artigo mencionado é omisso em relação a pontos relevantes, o que ocasiona dúvidas na hora de formalizar uma rescisão por mútuo acordo. A principal delas, sobre a qual passaremos a discorrer agora, diz respeito ao aviso prévio.

Consta expressamente do artigo 484, inciso I, alínea “a” da CLT, que será devido pela metade o aviso prévio, se indenizado. No entanto, o dispositivo nada menciona sobre o aviso trabalhado. Assim, no momento de operacionalizar uma rescisão por mútuo acordo pelos departamentos de recursos humanos, têm surgido dúvidas, a propósito, bastante legítimas. Sobretudo quando o cumprimento do aviso prévio é fundamental para a empresa, seja por se tratar de cargo estratégico ou para que haja tempo hábil ao treinamento de novo empregado para aquela posição.

Como a lei é omissa, torna-se necessária a busca em outras fontes do Direito. Por se tratar de temática recente, contudo, ainda não há entendimento jurisprudencial específico a esse respeito. Existe, contudo, entendimento doutrinário no sentido de que o aviso trabalhado deve ser cumprido na integralidade, aplicando-se o artigo 487 da CLT.

Uma ressalva importante feita pela doutrina, nesse ponto, é quanto à inaplicabilidade do artigo 488 da CLT, que prevê a redução da jornada, durante o aviso prévio, de duas horas diárias ou sete dias corridos, na rescisão contratual por mútuo acordo. Isso porque, pela redação do artigo 488, a redução da jornada durante o período do aviso aplica-se apenas “se a rescisão tiver sido promovida pelo empregador”, razão pela qual a melhor interpretação é no sentido de que a redução de jornada se aplica apenas na hipótese de dispensa sem justa causa, pelo empregador.

Nesse viés, caso o aviso prévio seja trabalhado, o melhor entendimento, a princípio, é no sentido de que o empregado deverá trabalhar por 30 dias, sem a redução de jornada prevista no artigo 488 da CLT, e fazendo jus à integralidade de sua remuneração pelo serviço prestado.

Na impossibilidade, porém, de o empregado cumprir os 30 dias de aviso prévio, paira o questionamento sobre o cumprimento parcial do aviso. Pois bem, tratando-se de rescisão contratual por mútuo acordo, e não havendo vedação expressa ao cumprimento do aviso prévio, a definição sobre o aviso ser trabalhado (total ou parcialmente) ou indenizado deve ser realizada de comum acordo pelas partes — até para evitar qualquer discussão de fraude na modalidade de rescisão.

Assim, concordando a empresa com o cumprimento parcial do aviso, não se vislumbra, a princípio, impedimento para que o aviso seja parcialmente cumprido.

Destacamos, aqui, porém, que todas essas questões devem ser acordadas com o empregado, sob pena de a rescisão ser considerada nula, em eventual discussão judicial, caso o empregado comprove que foi uma imposição da empresa, descaracterizando, assim, a rescisão por mútuo acordo prevista no artigo 484-A da CLT.

A recomendação, portanto, é que a definição sobre o aviso prévio conste expressamente do termo de rescisão por mútuo acordo, seja qual for a decisão tomada pelas partes (aviso trabalhado, indenizado pela metade ou parcialmente trabalhado).

Outra dúvida comum que tem assolado as empresas, na hora de calcular o aviso prévio devido numa rescisão por mútuo acordo, diz respeito à proporcionalidade prevista na Lei 12.506/11, que acresce três dias de aviso prévio por ano trabalhado.

Estando referida lei em plena vigência, e não havendo, em princípio, dispositivo com ela conflitante na reforma trabalhista, a maior parte da doutrina entende que a proporcionalidade do aviso prévio nela prevista aplica-se também às rescisões por mútuo acordo.

O que deve ser observado a esse respeito é que, na hipótese de aviso trabalhado, ainda que o empregado tenha mais de um ano de empresa (e, portanto, tenha direito a mais do que 30 dias de aviso prévio) , só poderão ser trabalhados, no máximo, 30 dias, conforme já decidido pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho, órgão responsável pela uniformização da jurisprudência dessa corte.

Entende a SDI-1 que a proporcionalidade da Lei 12.506/11 se aplica apenas em favor do empregado, não sendo possível exigir o cumprimento de aviso prévio superior a 30 dias[1].

Desse modo, no caso da rescisão contratual por mútuo acordo com empregado que tem direito à proporcionalidade do aviso prévio, se indenizado, deve ser paga a metade dos dias a que teria direito de acordo com a Lei 12.506/11, conforme expressamente estabelecido no artigo 484-A, inciso I, alínea “a” da CLT.

Já no caso de aviso prévio trabalhado, o entendimento que parece mais acertado é que o empregado cumpra, no máximo, 30 dias de labor, e que o restante dos dias a que teria direito, em função do tempo de empresa, seja indenizado pela metade, de modo a observar o entendimento já firmado pelo Tribunal Superior do Trabalho a respeito.

Por último, é válido ponderar que a reforma trabalhista está em vigor há menos de um ano e possui inúmeros pontos de omissão, até pelo contexto e tempo recorde em que o texto da Lei 13.467/17 foi aprovado. Assim, certamente, as discussões sobre o tema estão longe de se esgotar, sendo de suma importância acompanhar a evolução interpretativa do assunto na doutrina e na jurisprudência, bem como o seu tratamento no âmbito das negociações coletivas (convenções e acordos coletivos de trabalho).


[1] RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. AVISO PRÉVIOPROPORCIONAL. ALTERAÇÃO DA LEI 12.506/2011. OBRIGAÇÃO LIMITADA AO EMPREGADOR. AUSÊNCIA DE RECIPROCIDADE. A proporcionalidade do aviso prévio a que se refere a Lei 12.506/2001 apenas pode ser exigida da empresa, uma vez que entendimento em contrário, qual seja, exigir que também o trabalhador cumpra aviso préviosuperior aos originários 30 dias, constituiria alteração legislativa prejudicial ao empregado, o que, pelos princípios que norteiam o ordenamento jurídico trabalhista, não se pode admitir. Dessarte, conclui-se que a norma relativa ao aviso prévio proporcional não guarda a mesma bilateralidade característica da exigência de 30 dias, essa sim obrigatória a qualquer das partes que intentarem resilir o contrato de emprego. Recurso de embargos conhecido e provido. (RR – 1964-73.2013.5.09.0009 – Relator: Ministro Hugo Carlos Scheuermann – Subseção I Especializada em Dissídios Individuais – Publicado em: 29/09/2017)

Fonte: Ana Gabriela Primon – ConJur